terça-feira, 25 de agosto de 2009

Professor?


Por Germano Schwartz

Em todo o semestre que se inicia costumo lançar uma pergunta a meus alunos de graduação: qual o objetivo de vocês, no Direito, após a conclusão do curso? A maioria esmagadora pende para os “concursos”. Quando questionados qual, dizem: “qualquer um”. Grande parte deles respondem baseados não no aspecto vocacional e sim na recompensa (financeira) que terão com a aprovação. Nada mais normal.

Entretanto, de forma esporádica, alguém refere: quero dar aulas em uma “Faculdade de Direito”. Confesso que, mesmo após um certo tempo enquanto docente, ainda fico estático com esse objetivo. Não consigo, na hora, concatenar um diálogo de incentivo. Isso ocorre mais pela surpresa do que pela desilusão da profissão, afinal encontro nesses alunos o espelho de um Eu mais jovem, e, portanto, lúdico em relação ao trabalho escolhido. Ser professor, em qualquer nível da educação, é, por mais batida que soe a frase, uma vocação. Disso não tenho dúvidas. Ou se é professor ou, por mais que se deseje ou se aperfeiçoe, jamais se alcançará um estado de “Mestre”, designação carinhosa muito mais abrangente do que o título de stricto sensu. Um professor vocacionado melhora ao longo do tempo, tal qual um bom vinho. Um bom docente, sem vocação, pode, temporariamente, desempenhar um trabalho compatível. No entanto, estará fadado à estaticidade.

Contudo, gostaria de aperfeiçoar essa frase para referir que o ensino superior é vocação, mas, antes de tudo, uma profissão. Nesse sentido, como toda e qualquer atividade laboral, requer especialização, dedicação e abnegação. Levando-se em consideração que a profissionalização do Ensino do Direito no Brasil é algo absolutamente recente (graduei-me em 1995 e nenhum de meus professores eram “somente professores”), tem-se que ser profissional da educação jurídica no Brasil é, também, um caminho que vem sendo construído. Optei por trilhá-lo na direção da efetivação dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal de 1988. Há outras possibilidades.

Depois do “choque” tomado com a resposta do aluno que deseja ser professor, após uma semana, tradicionalmente, costumo dirigir-me a ele e repetir uma frase que vários ex-orientandos meus – e tenho orgulho de dizer que todos eles são excelentes profissionais do saber jurídico – cansaram de ouvir: “Quer ser professor? Então se vira”. Digo isso como um conselho. Faticamente sempre os auxilio. Subsidiariamente. No entanto, com isso eu pretendo alertá-los que há passos e caminhos que devem ser cumpridos. Eles devem ser descobertos pelo futuro professor, como forma de superação das dificuldades que enfrentarão, inevitavelmente, na academia. Seguir esse conselho, é, em minha opinião, um bom início, porque aquele que “se vira” será o docente com capacidade de improvisação e de superação de obstáculos.

De outro lado, ao contrário do velho ditado de que “todos os caminhos levam a Roma”, pode-se afirmar que nem todas as estradas levam à docência superior no ensino do Direito. Todavia, há mapas de orientação. Após a graduação, é altamente recomendável que o futuro profissional se especialize. Dada a configuração do ensino no Brasil, não é somente ensino a área de atuação desse profissional. Ele também deve estar apto a pesquisar e participar de projetos de extensão com a comunidade. Logo, a capacitação deve cobrir não somente a sala de aula, mas também as atividades de pesquisa e de extensão.

Dessa forma, a graduação não basta para quem desejar ser profissional do ensino jurídico. É necessário fazer, preferencialmente, um curso de especialização na área, para, depois, ingressar em um Mestrado. Ambos os diplomas habilitam o outrora aluno a se tornar professor. Caso deseje se tornar um pesquisador, com uma tese doutoral as portas se abrem com maior facilidade. Somando-se os cinco anos da graduação ao um ano e meio da especialização, aos dois anos do Mestrado e aos quatro de Doutorado, há um lapso temporal de quase 13 anos de formação. Mas isso não significa que o docente estará pronto. Ao contrário. Ele ouvirá, um dia, a clássica frase: “mas, professor, você somente dá aulas?”. A pergunta é colocada de tal forma que o docente passa a se assemelhar a um vagabundo ou a alguém que leva a vida “numa boa”. Aconselho, desde já, a deixar o autor da frase imerso em sua “sabedoria”. Algum dia ele, ou por vaidade ou por remorso, irá lhe procurar para pedirum espaço no ensino superior do Direito. Aí será o dia em que ele descobrirá que nada sabe, e, tal qual Sócrates, poderá visualizar a hercúlea tarefa de ser um profissional do ensino jurídico no Brasil.

Acredito, por fim, que a maior recompensa vem, contudo, sob outros formatos. Quando um Tribunal cita sua pesquisa. Quando um aluno obtém sucesso em seus “concursos”. Quando um aluno passa a ser professor. Quando você dá uma boa aula. Quando você cria laços de amizades duradouras com seus alunos. Ou, muito melhor, quando, em meu caso, você encontra, também na docência do Direito, em uma colega de profissão, sua esposa. Não há nada mais gratificante na existência humana.

Germano Schwartz é Pós-Doutor em Direito (University of Reading). Doutor em Direito (Unisinos) com doutorado sanduíche em Paris X-Nanterre. Professor do Mestrado em Direitos Fundamentais da ULBRA/CANOAS. Coordenador do Curso de Direito da ESADE (www.esade.com.br). Professor do Curso de Direito da Faculdade da Serra Gaúcha.

3 comentários:

  1. Nossa Rafael!! Texto simplesmente excepcional!!!
    Consegui enxergar, nesse relato, muitos de meus professores na graduação...
    Espero que se e quando eu conseguir chegar à docência, possa também fazer um excelente trabalho. Em especial porque tive ótimos exemplos do que é, de fato, ser um professor...

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Com certeza o senhor escolheu o caminho certo professor.
    Suas aulas são ótimas.
    Seu texto me fez pensar bem sobre o que eu quero; Espero obter sucesso em minha jornada e ser auto-realizada tal qual o senhor aparenta ser.

    Beijos

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